Para tentar conter demissões em meio a crise gerada pela pandemia do coronavírus (Covid-19), o governo do presidente Jair Bolsonaro estuda adotar medidas como o corte de até 50% da jornada e dos salários de trabalhadores.
As proposições devem ser encaminhadas ao Congresso por meio de medida provisória. Conforme as regras apresentadas pelo Ministério da Economia, as empresas devem pagar ao menos o salário mínimo. Também não será permitida a redução do salário-hora do trabalhador.
A MP pretende alterar o texto da CLT e pretende flexibilizar regras para que as empresas estabeleçam férias coletivas — que poderão abranger todo o grupo de profissionais das empresas ou apenas parte dele.
Conforme a regra anterior, os patrões tinham que avisar o governo e aos sindicatos da adoção dessas medidas ao menos duas semanas antes da execução. A equipe do ministro Paulo Guedes propõe a redução desse prazo para 48 horas.
As empresas também poderão suspender o pagamento do FGTS ao trabalhador para ter “mais flexibilidade para o fluxo de caixa da empresa”.
A ConJur ouviu especialistas em Direito do Trabalho sobre as propostas. O advogado trabalhista Livio Enescu afirma ser radicalmente contra. “Se o governo vai auxiliar com vários incentivos as empresas brasileiras, pelo que disse o Ministro Paulo Guedes, as mesmas devem manter os empregados com o mesmo salário por uma questão de igualdade. Todos têm que dar uma cota de contribuição em meio a essa dura crise. E os trabalhadores já estão dando a sua há muito tempo.”
A especialista Cristina Buchignani, por sua vez, diz acreditar que as propostas visam tornar flexíveis as negociações entre empresas e empregados, durante o período de estado de emergência. “Os acordos individuais, nesse período, serão preponderantes em relação à lei, respeitados os limites previstos na Constituição.”
Outro que enxerga aspectos positivos nas proposições é o advogado Alexandre Silvestre, Sócio do Briganti Advogado. “Por meio da nova legislação, pretende o governo principalmente flexibilizar alguns prazos que a CLT impõe como, por exemplo, notificação prévia de 30 dias para o início das férias do empregado. Isso é extremamente importante porque, não cumprido o prazo dessa medida administrativa, o empregador ficaria obrigado, em eventual processo trabalhista, a pagar o valor das férias novamente. É um ponto sensível que vem sendo tratado exaustivamente pelas empresas que buscam alternativas neste momento de crise”, diz.
Para Silvestre, a diminuição do prazo para comunicar as férias coletivas às autoridades e sindicato é de extrema conveniência. “O prazo atual não é condizente com a realidade e agilidade das operações.”
Já Veridiana Police, advogada trabalhista e sócia do escritório Finocchio&Ustra, diz que “as medidas anunciadas pelo governo visam colocar mais dinheiro à disposição das pessoas, além de socorrer as empresas com extensão do prazo de recolhimento do FGTS e da parte da União no Simples Nacional”.
“São providências tomadas para evitar que as empresas fechem ou demitam funcionários, o que agravaria ainda mais a situação que vivemos, cujos desdobramentos não se pode prever com segurança no curto prazo.”
Advogada trabalhista e previdenciária, Carolina Sautchuk afirma que as modificações dos contratos de trabalho propostas pelo governo são importantes. “Temos uma insegurança muito grande para os empregadores e os empregados.”
Contrato Verde e Amarelo
O pacote de medidas proposto pelo Ministério da Economia para evitar demissões não é a única polêmica governista envolvendo direitos trabalhistas desta semana.
Nesta terça (17/3), a comissão mista do Senado que analisa a MP 905/2019 teve seu relatório aprovado. O texto modifica a legislação trabalhista com a criação do Contrato Verde e Amarelo.
Contrária à medida, Sautchuk afirma que a aprovação do texto é inoportuna. “Não é a primeira vez que o poder legislativo brasileiro toma decisões como essa em um momento de comoção social. Na década de 1990, em meio a Copa do Mundo, o governo aprovou regras que alteraram a legislação previdenciária. Novamente vemos esse tipo de postura que desrespeita qualquer regra ética já vivemos um momento de comoção com a pandemia do coronavírus”, argumenta.
A aprovação do relatório da MP 905/2019 também foi alvo de duras críticas da Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas
A Abrat (Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas), Associações filiadas e Entidades parceiras, cientes da aprovação do relatório da MP 905/2019, pela Comissão Mista, manifestam total REPÚDIO em relação á estratagema arquitetada para sepultar o direito do trabalho, que já se encontra na UTI desde a Lei 13467/2017, para asfixiar a Constituição Federal e destruir Normas Internacionais do Trabalho das quais o Brasil é signatário.
A realização da sessão na Casa Legislativa aconteceu, não obstante a ausência de parlamentares, maiores de 65 (sessenta e cinco) anos, que integram a comissão e estão em autoisolamento por causa da pandemia do Coronavirus e não puderam participar dos debates.
Aprovaram o relatório de uma MP que mais uma vez agrava o desmantelamento do direito do trabalho sem a participação popular, por causa de ato do Presidente da Comissão que restringiu o acesso á sessão para cumprimento dos protocolos necessários de prevenção, controle e contenção de riscos do Covid-19.
Atuaram na mesma velocidade de disseminação do vírus e no mesmo dia em que foram registrados no Brasil 329 casos confirmados em 17 estados e no Distrito Federal. No mesmo dia em que foi registrada a primeira morte em São Paulo.
Realizaram a sessão para inocular um vírus ainda mais grave, que é o do aprofundamento da desigualdade social, que está estampada tanto no texto da MP, como também nos procedimentos protocolares expedidos até o presente momento de contenção do corona e que não contemplam qualquer espécie de proteção a diversos trabalhadores e classes sociais que dependem do transporte público, de diárias, de plataformas digitais, por exemplo.
Mais uma vez, MP que altera significativamente a vida humana é aprovada às escondidas, porque realizada sessão sem o povo, sessão sem os interessados, sem debates, o que corrói o próprio conceito primário de Parlamento.
Compartilhamos com a sociedade brasileira a indignação que nos tomou conta a partir da ciência da decisão da aprovação do relatório da MP 905/2019, enquanto a sociedade brasileira está alarmada, arde em febre e sente as dores cravadas em seus corpos dos sintomas de um vírus que se alastra de norte a sul do país, causando o medo e a insegurança. Aproveitar-se de um momento grave de uma pandemia que obriga homens e mulheres ao recolhimento para aprovar Medida Provisória mais uma vez sem o devido diálogo social e que altera profundamente a legislação do trabalho é manter viva a ganância, o empobrecimento da classe trabalhadora e a crise social que isola cada vez mais os vulneráveis em relação aos direitos sociais A anulação imediata da votação do relatório é medida que se impõe.
ABRAT-Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas e associações filiadas.
MP 905/2019