Deputados e especialista indicam que reforma da Previdência pode impedir aposentadorias rurais

23 de maio de 2019

Representante do governo afirma que há muitas mentiras sobre trabalhadores rurais sendo disseminadas, como menor expectativa de sobrevida, início do trabalho mais cedo e situação de extrema pobreza

 

 
Michel Jesus/Câmara dos Deputados
Audiência pública sobre a aposentadoria do Trabalhador RuralAudiência pública da comissão especial que analisa a reforma da Previdência

 

Deputados e entidade de direito previdenciário afirmam que novas regras podem impedir trabalhadores rurais de se aposentar, mas governo ressalta que a proposta de reforma da Previdência (PEC 6/19) é baseada em dados e não mentiras.

O assunto foi debatido nesta quarta-feira (22) em audiência pública da comissão especial que analisa a matéria.

Para a presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), Jane Lúcia Berwanger, o pagamento de R$ 600 fixos por ano, por núcleo familiar, previsto na reforma, ignora a instabilidade da produção no campo, por questões climáticas ou pragas.

“Se colocasse para o trabalhador escolher se prefere pagar 3% ou 4% do faturamento anual, em vez de pagar uma contribuição fixa, certamente ele iria preferir a primeira opção, porque ele não sabe quanto vai ganhar com a venda da produção”, disse.

Berwanger disse que as regras podem fazer com que os trabalhadores rurais sejam jogados na miserabilidade e precisem recorrer ao Benefício de Prestação Continuada (BPC). “Temos de decidir se vamos valorizar o trabalho rural ou se vamos dar esmola para essas pessoas.”

A especialista alertou ainda para o risco de generalização sobre fraudes no setor. Ela explica que os 97 mil indícios de fraude em aposentadorias rurais apontados por auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU) representam 1% do total de 9,5 milhões de benefícios concedidos. Para o deputado Vinícius Poit (Novo-SP), porém, o sistema atual acaba produzindo injustiças e favorece fraudes. “Os bons pagam pelos ruins e isso é muito duro e injusto”.

Contra as mudanças
Deputados de vários partidos se posicionaram contra as mudanças. O deputado Heitor Schuch (PSB-RS) afirmou que a contribuição obrigatória é um problema para boa parte dos agricultores rurais. “No ano que não chove e que não tem safra, como é o caso do Nordeste? Como fazer”, indagou. Ele fez um apelo para que os trabalhadores rurais ficassem de fora da reforma.

O deputado Beto Pereira (PSDB-MS) afirmou que o partido já se posicionou a favor de retirar a aposentadoria rural e o Benefício da Prestação Continuada (BPC) da proposta.

As análises do Executivo estão descoladas da realidade, na opinião do deputado Bira do Pindaré (PSB-MA). “Uma coisa é olhar os números na frieza do ar condicionado e outra é a realidade que a gente vive. Conversem com as pessoas e acabem com o discurso de fraude, porque fraude há em todo lugar. Se fraude for critério, vamos fechar as portas de tudo.”

O deputado José Guimarães (PT-CE) afirmou que as mudanças da PEC aumentarão a pobreza rural. “O direito à aposentadoria é clausula pétrea.”

Em março, treze partidos se posicionaram contra a inclusão da aposentadoria rural na reforma.

Dados do governo
Representante do governo na audiência, o secretário especial adjunto de Previdência e Trabalho no Ministério da Economia, Bruno Bianco, afirmou que as mudanças propostas na reforma da Previdência (PEC 6/19) são baseadas em dados e não mentiras.

Segundo Bianco, “muita mentira é dita em relação ao trabalhador rural”. Ele cita, por exemplo, a diferença na expectativa de sobrevida. “No urbano e no rural é muito próxima”, disse. Bianco também destacou que 3 em cada 4 trabalhadores que começam a trabalhar antes dos 14 anos moram nas cidades e não no campo. E que a maioria (60%) dos que vivem em extrema pobreza também estão em ambiente urbano. “Peço perdão pela palavra, mas é mentira e temos de desdizer todas as falsidades que se dizem em relação ao rural. É nossa função enquanto governo desdizer essas falácias.”

O secretário afirmou que a mudança sugerida na reforma vai fazer com que o trabalhador rural tenha acesso a outros benefícios previdenciários, como auxílio-doença e salário-maternidade. “Hoje o rural é excluído do sistema. Ele só nasce para o INSS quando se aposenta.”

A reforma estabelece idade mínima de 60 anos para trabalhadores e trabalhadoras rurais. Hoje, as mulheres do campo se aposentam aos 55 anos. A proposta também amplia de 15 para 20 anos o tempo de contribuição para os dois sexos. As mudanças serão feitas gradativamente, segundo a PEC, até atingir os valores pretendidos em 2030.

Além disso, os segurados especiais (trabalhadores rurais e pescadores artesanais) vão precisar pagar pelo menos R$ 600 por ano referente ao faturamento da produção.

“O rural já contribui para o sindicato com R$ 20 por mês por pessoa, na média. Portanto, eles já pagam para o sindicato mais do que pagarão para a Previdência”, ponderou Bianco. Segundo ele, o governo chegou ao valor da contribuição de R$ 600, por núcleo familiar, a partir do cálculo do faturamento médio de agricultores familiares nos últimos anos.

O governo pretende economizar R$ 92 bilhões em 10 anos com as mudanças de aposentadoria para os segurados especiais, ou 7,5% dos R$ 1,2 trilhão desejados pelo Executivo.

 

ÍNTEGRA DA PROPOSTA:

 

Agência Câmara, 23 de maio de 2019