Em acordo, TST troca regra extinta na reforma trabalhista por bônus

18 de dezembro de 2018

Pagamento por trajeto entre casa e empresa é atrelado a assiduidade; Vale e sindicatos aceitam

Extinto pela reforma trabalhista, o pagamento ao empregado pelo deslocamento entre sua residência e o local de trabalho foi substituído por um bônus com base na assiduidade. A regra consta de acordo firmado entre a Vale e dois sindicatos.

A proposta foi apresentada a empresa e entidades pelo vice-presidente do TST (Tribunal Superior do Trabalho), ministro Renato de Lacerda Paiva.

Os sindicatos de extração de ferro e metais básicos de Marabá e região (PA) e Belo Horizonte e região participaram das negociações com a companhia. O acordo foi assinado no dia 5 de dezembro.

Segundo especialistas, a medida vira uma referência para outros casos, mas respeita o princípio do negociado sobre o legislado.

O tempo de deslocamento entre a residência e o posto de trabalho era a antiga jornada “in itinere”.

O acordo, como determina a reforma trabalhista, não obriga o pagamento referente a essas horas em trânsito. No entanto, prevê prêmio semestral pelo período de dois anos (2018-2019) para os trabalhadores menos faltosos.

Segundo os sindicalistas, o fim da remuneração sobre o tempo de deslocamento representaria perda de 9% a 30% nos salários dos funcionários da Vale. O impasse foi solucionado no TST.

“Tem trabalhador que gasta até três horas por dia no deslocamento para essas minas. Então a lei dizia que esse tempo deveria ser pago em hora ‘in itinere’. Acontece que a reforma trabalhista veio e cortou isso”, disse Raimundo Amorim, presidente do sindicato do Pará.

“Nós fomos ao TST, pedimos a mediação, e mostramos o prejuízo que isso significa.”

Segundo ele, a Vale não chegou a cortar a remuneração dos trabalhadores, mas a proposta da empresa era seguir as novas regras. “Como a lei entrou em vigor no começo do ano, e o acordo venceu agora, a empresa disse que iria cortar o benefício.”

A Vale, em nota, informou ter celebrado a negociação coletiva e que “o acordo atende aos interesses da empresa e dos empregados”.

Segundo Sebastião Alves, presidente do sindicato de Minas, a jornada “in itinere” agora é transformada no prêmio semestral, pago de forma acumulada (e antecipadamente). O primeiro bônus será depositado em janeiro.

“É lógico: ninguém paga horas ‘in itinere’ para quem não vai trabalhar. Isso faz parte do trajeto que ele faz para ir trabalhar. Se falta em 30 dias de serviço, ele não pode receber essas horas”, disse Alves.

As ausências justificadas implicarão desconto de 1% por falta e as não justificadas, 5%.
Para a advogada Mayra Palopoli, a negociação cria regras para adaptação do trabalhador. “Isso pode indicar um precedente em negociações coletivas.”

Ela destaca o caráter temporário da medida. “Os empregados estavam habituados a receber esse pagamento, então ter esse corte repentino acaba gerando uma situação social difícil.”

Para Otavio Pinto e Silva, sócio do escritório Siqueira Castro e professor de direito do trabalho da USP (Universidade de São Paulo), a reforma permitiu adaptação das condições de trabalho à realidade de cada empresa.

Esta não é a primeira vez que o TST apresenta uma proposta alternativa às regras da reforma trabalhista, em vigor há um ano.

A Folha mostrou, em 21 de junho deste ano, que Lacerda Paiva foi o autor da proposta, e a estimulou, de impor o desconto de meio dia de trabalho como uma alternativa para garantir o financiamento dos sindicatos.

A cota negocial, como foi chamada, substituiu o imposto sindical obrigatório.

 

As regras criadas pelo acordo

 

O que é jornada ‘in itinere’?
Estava na CLT e previa o pagamento pelo tempo de deslocamento entre a casa do trabalhador e a empresa

 

O que mudou?
Foi extinta com a reforma

 

O que fez o TST?
Mediou acordo no qual propôs substituir a jornada ‘in itinere’ por uma bônus semestral entre sindicato de mineradores e a Vale

 

Folha de São Paulo, 18 de dezembro de 2018