Entrevistadores priorizaram bater na origem das informações da Vaza Jato, e não no conteúdo que pôs a Lava Jato na parede. Receberam aula de jornalismo
A atuação dos entrevistadores do Roda Viva ante o jornalista Glenn Greenwald, na noite de ontem (2), o obrigou a dar uma aula sobre a profissão. Tentaram colocar Glenn contra a parede, como se o crime nas revelações do The Intercept Brasil, e não no conluio. com objetivos políticos, entre juiz e procuradores.
As perguntas insistiram na ideia da imprensa corporativa – liderada pela Globo – de defesa cega da Lava Jato. Em vez de colocar na pauta o conteúdo do material obtido por Glenn, que incrimina gente poderosa como o ex-juiz, hoje ministro do governo Bolsonaro, Sergio Moro, elegeram como vilã a forma como o material foi obtido.
Não poucas os entrevistadores beiraram a hostilidade, insinuando que Glenn Greenwald teria relação com hackers.
“Quantos furos Eduardo Cunha deu para jornalistas brasileiros? Por que isso nunca virou um caso tão debatido assim?“
(Leandro Demori, editor-executivo do Intercept
Das 38 perguntas feitas pela bancada do Roda Viva, apenas seis tiveram relação com o conteúdo das ilegalidade reveladas pelas reportagens do The Intercept Brasil, envolvendo Moro e os procuradores liderados por Deltan Dallagnol. As outras 32 foram intimidações para que Glenn falasse sobre suas fontes, preocupação com o futura da Lava Jato, insinuando que Glenn estaria arruinando o combate à corrupção no Brasil.
O jornalista mostrou que não: a Vaza Jato fortalece o combate à corrupção ao revelar os métodos corruptos de Moro e da Lava Jato. Glenn teve de repetir conceitos básicos da profissão de jornalista para jornalistas. Foi obrigado a lecionar.
Resultados
A jornalista Milly Lacombe, da revista TPM, postou em sua conta no Twitter a análise dos entrevistadores do Roda Viva. “O que me causa estranheza – ontem como intuição, hoje como tabulação – é dedicar 84% das perguntas para colocar Greenwald numa parede em que deveriam estar Deltan, Moro e cia”, questionou.
Milly lembrou que, naturalmente, questões sobre o método jornalístico apareceriam na entrevista. É de interesse comum. Mas o bizarro foi a atenção total. “Portanto, apenas 16% das perguntas questionaram o conteúdo de revelações que podem mudar a história do Brasil. Eu acho natural que haja perguntas sobre o hacker, sobre os métodos da Vaza Jato, sobre riscos para a Lava Jato. Isso também é jornalismo (…) Isso sem falar na paranoia de um dos jornalistas com o Lula, cujo nome entrava em quase todas as perguntas que ele fazia. Eu acho uma pena”, finalizou.
Ainda sobre a obtenção do material e a obsessão dos entrevistadores, o editor-chefe do The Intercept Brasil, Leandro Demori, ironizou: “Outras perguntas que eu sempre estranho em entrevistas (e foram repetidas no Roda Viva) são as sobre a ética da fonte ou sobre possíveis crimes da fonte, como se jornalistas só trabalhassem com informações obtidas com a Virgem Maria (…) Jornalistas conseguem informações com traficantes, com assassinos, com milicianos e com corruptos de toda sorte. Quantos furos Eduardo Cunha deu para jornalistas brasileiros? Por que isso nunca virou um caso tão debatido assim?”