Na primeira etapa das alterações, governo federal flexibilizou exigências para uso de máquinas, e revogou inspeção em novos estabelecimentos
Flexibilização no uso de máquinas e equipamentos, reaproveitamento de treinamentos realizados pelos trabalhadores e fim da inspeção prévia antes da inauguração de novos estabelecimentos. Esses são alguns dos efeitos práticos que começam a surgir um mês após a revisão nas normas regulamentadoras (NRs) de segurança e saúde do trabalho 1, 2 e 12, anunciada pelo governo federal no final de julho.
A Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Economia calcula que a revisão das três normas vai gerar economia de R$ 68 bilhões ao setor produtivo ao longo de uma década. A maior parte desse montante viria do enxugamento da NR 12, que estabelece as diretrizes para a utilização de maquinário no ambiente de trabalho. Um dos principais beneficiados pela reformulação é o setor calçadista, que terá impacto direto em 31 máquinas. A retirada da obrigatoriedade de adaptações nos parques fabris das empresas pode gerar economia de R$ 450 milhões, nas contas da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados).
– Esse valor é 2% de toda a produção da indústria calçadista em 2018. A economia se dará pelo fato de não termos de investir nas adaptações das máquinas – afirma Haroldo Ferreira, presidente da Abicalçados.
Ferreira aponta que havia adequações exigidas pelo texto antigo mais caras do que o próprio equipamento. É o caso da máquina de ilhós, usada para aplicar a argola onde passa o cadarço, avaliada em torno de R$ 5 mil e que precisaria receber válvulas extras, que sairiam por R$ 6 mil. Outro exemplo é o da máquina de costura, que necessitava de um circuito eletrônico extra, ao custo unitário de R$ 3 mil.
Também revisada pelo governo federal, a NR 1 possibilitará que o trabalhador, caso mude de emprego, reaproveite na íntegra as capacitações recebidas durante o vínculo anterior. Além disso, cerca de 1,3 milhão de micro e pequenas indústrias e comércios que exercem atividades de baixo risco não terão mais de realizar os Programas de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA) e de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO). O coordenador da especialização em engenharia de segurança do trabalho da Unisinos, Rogério de Paiva, avalia que a nova formatação poderá deixar brechas.
– A flexibilização vai induzir o dono da pequena empresa a não fazer laudos e às vezes a atividade dele pode ter algum risco físico, químico ou biológico – pondera.
Entre as três normas regulamentadoras revisadas até o momento – a previsão é de que outras também sejam revistas –, a que deverá ter menos impacto é a revogação da NR 2, sobre a inspeção prévia em novos estabelecimentos.
– Era uma norma anacrônica. Na prática, não funcionava, pois não há fiscais suficientes para fazer a inspeção – constata Renato Futuro, presidente do Sindicato dos Auditores-Fiscais do Trabalho no Rio Grande do Sul (Agitra Sindical).
Conforme o presidente da Federação dos Trabalhadores nas Indústrias do Calçado e do Vestuário do RS, João Nadir Pires, a modificação gera grande preocupação para os trabalhadores. Segundo ele, o mercado que produz componentes para calçados, por exemplo, é perigoso para o profissional.
— Quem produz solas de tênis lida com navalhas extremamente perigosas. É preciso ter muito cuidado quando se fala em flexibilizar as normas — diz. — Quando o empresário fala em economia, nós questionamos sobre a saúde do trabalhador. Economia a que custo? Nossa opinião é diferente.
Principais mudanças em vigor
NR 1 (Alterada)
- Toda microempresa (ME) ou empresa de pequeno porte (EPP) de atividade que não possui riscos químicos, físicos ou biológicos está dispensada de elaborar o PPRA – utilizado para detectar riscos – e o PCMSO – que determina os exames que o trabalhador deve fazer em caso exposição ao risco.
- Treinamentos realizados pelo trabalhador, como trabalho em altura e espaço confinado, poderão ser reaproveitados desde que tenham sido concluídos há menos de dois anos. A convalidação ocorrerá quando o trabalhador trocar de empresa, mas seguir na mesma atividade. Há ainda a possibilidade de aproveitamento parcial dos conteúdos, nos casos em que a pessoa migre para uma atividade diferente.
NR 2 (Revogada)
- A norma determinava que todo novo estabelecimento deveria solicitar a aprovação de suas instalações em órgão regional ligado ao extinto Ministério do Trabalho. O objetivo era assegurar que a empresa iniciasse as atividades sem riscos de acidentes e doenças do trabalho. Com a revogação da NR, a inspeção não é mais necessária.
NR 12 (Alterada)
- Máquinas industriais com certificação do Inmetro não precisarão passar por novas adequações. A mesma situação vale para equipamentos adquiridos no Exterior, salvo aqueles que tenham alguma especificação prevista em lei brasileira.
- Os sistemas robóticos que obedecem às normas técnicas oficiais brasileiras, como as da ABNT, ou que estejam de acordo com normas internacionais automaticamente estão em conformidade com os requisitos de segurança.
- Os itens relativos à ergonomia foram retirados da NR 12. Agora, o tema é tratado exclusivamente na NR 17.
- As empresas não são mais obrigadas a manter inventário detalhado das máquinas e equipamentos com suas especificações.
Fontes: coordenador da especialização em Engenharia de Segurança do Trabalho da Unisinos, Rogério de Paiva, e Secretaria de Política Econômica do Ministério da Economia