Professor da Unicamp defende que as decisões econômicas carregam considerações morais e que a simples busca do equilíbrio de mercado pode atropelar direitos.
A receita é simples: o Brasil precisa “retomar emprego e renda por meio de investimentos públicos e gastos sociais” para que o grave quadro de desigualdades socioeconômicas no país seja combatido. O caminho para executar a receita simples, no entanto, é repleto de obstáculos e tortuoso, graças à mentalidade predominante. O financiamento das políticas públicas esbarra em um conflito no modo como duas áreas, a economia e os direitos sociais, compreendem que deve ser feito o investimento estatal dos recursos públicos em momentos de crise econômica, como a que o Brasil enfrenta nos últimos cinco anos.
De acordo com o economista e professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Pedro Rossi, contradições e conflitos de linguagem marcam a atuação da economia e dos direitos sociais. “A economia tradicional faz uso de uma abordagem positiva para buscar uma alocação eficiente de recursos escassos em que bens e serviços são distribuídos desigualmente. Já os direitos humanos seguem padrões normativos que buscam direitos universais, com equidade no acesso”, afirma, em entrevista à jornalista Patricia Fachin, para o IHU On-Line.
Um exemplo prático da divergência entre as duas é visível quando, “para os economistas, uma alocação ótima no mercado imobiliário, por exemplo, pode aceitar a situação em que parte da população esteja sem teto para morar. Já segundo a visão dos direitos humanos, é inaceitável que alguém não possua condições dignas de moradia”, exemplifica.
A resolução desse conflito, na compreensão do economista, depende de uma articulação entre a economia e os direitos sociais para “reconhecer que as decisões econômicas carregam considerações morais e que a busca da eficiência e dos supostos equilíbrios de mercados podem atropelar direitos”.
Na entrevista, Rossi frisa que “princípios básicos” estão sendo ignorados no debate brasileiro sobre a política fiscal. “É comum ouvir, de economistas e políticos, que as demandas sociais devem se adaptar ao orçamento. Mas o orçamento público expressa o que a sociedade quer financiar coletivamente. A definição do orçamento e o tamanho do Estado devem refletir as demandas sociais. O contrário não faz sentido: pensar que um tecnocrata vai definir o que deve ser um orçamento é simplesmente antidemocrático”, assinala.
Rossi assegura que a proposta de criar emprego e renda para a população não compromete o orçamento federal, como sustentam os reprodutores do discurso neoliberal. Segundo ele, se isso implicar aumento de 5% da dívida pública “nada” vai acontecer, porque “ela já aumentou 20% do PIB de 2014 para cá, com as políticas de austeridade”.