Startup cria “vale terapia” para empresas cuidarem da saúde mental de funcionários

24 de julho de 2018

Criada em 2016, a startup Vittude estimula as empresas a pagarem um valor fixo mensal para que os colaboradores tenham acesso a uma rede de psicológos

Estresse, ansiedade, depressão. Entre 2012 e 2016, os transtornos mentais e comportamentais foram a terceira principal causa de afastamentos do trabalho no Brasil. Esses e outros dados sobre o tamanho desse problema para profissionais, empresas e governo levaram a startup Vittude a lançar uma espécie de “Gympass” da saúde mental.

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Funciona como o famoso benefício do exercício físico oferecido por muitas empresas, porém focado no bem-estar mental dos colaboradores. As empresas pagam um valor fixo mensal por colaborador para que eles tenham acesso à rede de psicólogos da Vittude. As consultas podem ser realizadas de forma presencial ou online, permitindo, assim, que funcionários que moram em cidades menores ou até em outros países também possam usar o serviço, batizado de Vittude Corporate.

A startup Vittude foi criada em 2016 pelos engenheiros Tatiana Pimenta e Everton Höpner Pereira. A plataforma conecta psicólogos e pacientes em todo o Brasil (e também fora dele) por meio do atendimento presencial ou online. Ao todo, são 1.700 profissionais em 225 cidades brasileiras e por volta de 620 mil visitantes únicos por mês na plataforma.

A ideia do “Gympass” mental ganhou fôlego informalmente, em uma conversa de Tatiana com uma amiga, também startupeira. A amiga queria oferecer às sócias um “vale terapia”, para ajudar a aliviar a tensão do dia a dia. O estresse e a ansiedade são uma constante nesse universo em que qualquer detalhe pode significar o sucesso ou o fracasso de um negócio.

Tatiana e o sócio formataram o serviço de duas formas: uma funciona basicamente como um “vale-refeição”, em que a empresa paga um valor mensal por funcionário e subsidia uma parte ou o total do valor da consulta. O segundo modelo é um mapeamento de risco em empresas interessadas, especialmente onde os níveis de afastamento por transtornos mentais são altos. Neste caso, a atuação é mais corretiva do que preventiva, pois o benefício ajuda no tratamento do profissional afastado, lembra Tatiana.

O meu sonho é que em poucos anos a gente cuide tão bem da cabeça quanto cuidamos do corpo. Todo mundo, em algum momento da vida, vai passar por situações difíceis perdas, separações, dores, estresse e ansiedade. Com a tecnologia, o ritmo hoje é tão frenético que, muitas vezes, as pessoas nem se dão conta de que adoeceram. É preciso ampliar o conhecimento da população sobre saúde mental, diz a CEO da Vittude.

O primeiro estalo para a criação da startup veio justamente em um momento difícil da vida de Tatiana, logo após uma demissão e o diagnóstico de um problema sério de saúde do pai. Após 13 anos no mercado corporativo, com passagens por empresas como?Votorantim e Arauco do Brasil, ela sentiu que era a hora de dar uma pausa na carreira para estar mais próxima da família. Ao buscar referências sobre médicos especialistas para o tratamento, se deparou com a falta de falta de um sistema online com informações e recomendações desses profissionais de saúde. Essa inquietação foi a semente da Vittude.

Amadureceu a ideia e chamou o amigo Everton para ser sócio, no final de final de 2015. Os dois mergulharam fundo no universo das startups. Tatiana queria algo relacionado à telemedicina, que usasse a tecnologia para esclarecer pequenas dúvidas de saúde por meio de uma orientação mais profissional. Ele queria produzir um site de avaliação de profissionais da saúde. Em julho de 2016, na segunda tentativa, eles foram selecionados para o programa da aceleradora Startup Farm. Lá foram orientados a segmentar o negócio.

“Entendemos que a Psicologia era o caminho, principalmente porque a área já permitia o atendimento online. Focamos em saúde mental e mergulhamos de cabeça nesse universo. Quando olhamos os números de afastamento e produtividade, percebemos o tamanho do problema”.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de 300 milhões de pessoas em todo o mundo sofrem de depressão, principal causa de incapacidade para o trabalho, e mais de 260 milhões vivem com transtornos de ansiedade. Os gastos relacionados a quadros de transtornos mentais custarão à economia mundial U$6 trilhões até 2030, de acordo com o Fórum Econômico Mundial.

A Vittude saiu do programa de aceleração no dia 10 de agosto de 2016 e, em 1.º de setembro, a plataforma registrou o agendamento da primeira consulta. A startup começou apenas com atendimento presencial até que a ferramenta que permite o atendimento online fosse desenvolvida. A equipe da Vittude levou quatro meses para desenvolver a tecnologia, que atende requisitos e parâmetros internacionais de segurança de dados dos pacientes. Depois, foram mais nove meses até a validação do Conselho Federal de Psicologia. Em setembro de 2017, o consultório virtual estava no ar.

       

Atendimento online cresce a olhos vistos

O atendimento online é o que mais cresce na Vittude, segundo Tatiana. Hoje responde por 48% de todas das consultas – há dois meses equivalia a 35%. O crescimento acelerado das consultas online também é resultado dos investimentos feitos em marketing de conteúdo, com destaque para um blog da Vittude, que nasceu antes mesmo da plataforma da startup, além de um ebook sobre ansiedade e uma tabela periódica que reúne 56 transtornos emocionais separados por tipos: transtornos de ansiedade, obsessivos, alimentares, de personalidade, parafílicos, depressivos e de humor, entre outros.

As pessoas estão na internet buscando respostas para os seus problemas, quem saber como tratar ansiedade ou depressão. O conteúdo esclarece e ajuda a levar essa pessoa até a plataforma, diz Tatiana.

O valor das consultas é democrático, varia de R$ 40 a R$ 500. O preço médio das consultas, puxado principalmente por profissionais de São Paulo, é de R$ 120 para o atendimento presencial e R$ 80, no online. Cada psicólogo define o preço do serviço. Para estar na plataforma, os profissionais, com idade média de 43 anos, pagam uma mensalidade e a Vittude fica com 10% do valor de cada consulta.

A Vittude, que começou com investimento dos sócios, participou de uma rodada de investimentos no ano passado e recebeu R$ 650 mil. A ideia é abrir nova rodada de captação assim que terminar o programa de aceleração na Estação Hack, o primeiro centro para inovação criado pelo Facebook no mundo. A Vittude foi uma das dez startups de impacto social escolhidas para aceleração pela Artemisia em parceria com o Facebook. Essa é a segunda turma do programa, que começou em julho deste ano e tem duração de seis meses.

Gazeta do Povo, 24 de julho de 2018.