Brasil de novo na ‘lista suja’ sobre violação de direitos trabalhistas. Lei ‘desumana’, dizem centrais

12 de junho de 2019

Já o governo, que sequer enviou um ministro, afirma que legislação é moderna e reclama de “intromissão” em assuntos internos. Mas é país-membro da OIT e ratificou várias de suas convenções.

 

Guterres (à esq.) e Ryder (dir.) na comemoração do centenário da OIT: defesa do multilateralismo e do diálogo social

 

O Brasil voltou a ser incluído na chamada “lista suja” da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que inclui 24 países a serem questionados por possível violação de direitos, com base na Convenção 98, sobre negociação coletiva. O país é denunciado pelas centrais sindicais. Para elas, qualquer alteração de leis deve passar por “ampla e transparente consulta às entidades mais representativas de empregadores e trabalhadores”, o que não ocorreu, afirmam, no caso da Lei 13.467, de “reforma” trabalhista, aprovada em 2017.

A decisão de incluir o Brasil ocorreu hoje (11), no segundo dia da 108ª Conferência Internacional do Trabalho, na sede da OIT, em Genebra. O país já integrava uma lista preliminar, com 40 integrantes, feita pelos peritos da organização. Agora, está na short list, a lista curta, entre as prioridades de análise.

Em nota, as seis centrais formalmente reconhecidas “reafirmam o caráter cruel e desumano da reforma trabalhista que, ao contrário do que prometia, não gerou empregos decentes, mas apenas precarização laboral, fragilização das relações de trabalho, insegurança jurídica e um aprofundamento de uma crise que somente será superada com a geração de empregos decentes, que façam com que a classe trabalhadora possa voltar a aspirar uma vida melhor e não apenas sobreviver em trabalhos intermitentes, precarizados, insalubres e enriquecendo aqueles que apoiaram esta reforma com o objetivo único de reduzir custos no lombo do trabalhador e da trabalhadora”. Assinam o documento CSB, CTB, CUT, Força Sindical, Nova Central e UGT.

Representante dos empregadores na convenção, Alexandre Furlan, da Confederação Nacional da Indústria (CNI), disse que a “reforma” não afronta a Convenção 98, de acordo com relato do repórter Jamil Chade em seu blog no portal UOL. O empresário disse ver “viés mais político que técnico” na decisão.

Já o governo brasileiro, apesar da importância do evento, não mandou nenhum ministro. Segundo o jornalista, em carta, o Executivo afirmou que não violou nenhuma convenção e que tem uma legislação trabalhista “moderna”. E disse que não aceitaria questionamento sobre “assuntos internos do Brasil, sem relação qualquer com assuntos trabalhistas”. O país é membro fundador da OIT e assinou várias de suas convenções, inclusive a 98.

O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, participou de evento comemorativo dos 100 anos da OIT. Segundo ele, a organização “é o símbolo de uma visão de multilateralismo que vai além das relações entre os governos”. “O multilateralismo é, cada vez mais, algo que todos os atores devem adotar a nível social, nacional e mundial”, acrescentou, ao lado do diretor geral da OIT, Guy Ryder.

 

Leia na íntegra a nota das centrais

A comissão de normas da OIT manteve o Brasil na lista de 24 países que mais violam convenções internacionais do trabalho, na manhã desta terça feira, 11 de junho. A inclusão se deu porque a reforma trabalhista aprovada no governo Temer violou a convenção 98, relativa à aplicação dos princípios do direito de organização e de negociação coletiva, ratificada pelo Brasil, que, entre outros pressupostos, obriga os estados, ao modificar leis trabalhistas, a realizar processos de ampla e transparente consulta às entidades mais representativas de empregadores e trabalhadores, o que não ocorreu no processo de elaboração da reforma.

Desde o ano passado, quando o Brasil entrou na lista, e providências foram solicitadas ao governo brasileiro para a comprovação de que a reforma trabalhista não violou as convenções que são citadas na denúncia feita pelas centrais sindicais, o governo brasileiro, em vez de cumprir com as solicitações da OIT, se engajou em um processo de tentar deslegitimar a organização e seu sistema de controle, além de atacar as entidades sindicais brasileiras e a própria OIT.

O discurso feito pelo então ministro do trabalho Helton Yomura entrou para os anais da OIT como um dos mais vergonhosos capítulos da história desta organização.

As centrais brasileiras, presentes na 108ª Conferência Internacional do Trabalho, ano do centenário da organização, celebram a decisão tomada pela Comissão de Aplicação de Normas da OIT, e reafirmam o caráter cruel e desumano da reforma trabalhista que, ao contrário do que prometia, não gerou empregos decentes, mas apenas precarização laboral, fragilização das relações de trabalho, insegurança jurídica e um aprofundamento de uma crise que somente será superada com a geração de empregos decentes, que façam com que a classe trabalhadora possa voltar a aspirar uma vida  melhor e não apenas sobreviver em trabalhos intermitentes, precarizados, insalubres e enriquecendo aqueles que apoiaram esta reforma com o objetivo único de reduzir custos no lombo do trabalhador e da trabalhadora.

Seguimos em luta para que cada trabalhadora e cada trabalhador possa se desenvolver em um trabalho seguro, devidamente remunerado, socialmente protegido e com plena liberdade, e que suas organizações sindicais sejam respeitadas e lhe seja assegurado amplo e eficiente diálogo social, nos moldes do que é estabelecido pela OIT em seus princípios fundacionais e em suas convenções e recomendações.

 

RBA, 12 de junho de 2019