Em 2020, oposição apostará no diálogo para tentar reforma tributária mais justa

18 de dezembro de 2019

A comissão especial da reforma na Câmara dos Deputados, criada em julho, só votará o relatório da PEC 45, do deputado Baleia Rossi, no ano que vem.

 

No Brasil, sistema é injusto e impostos são cobrados principalmente sobre consumo – TÂNIA RÊGO/ABR

 

A comissão especial da reforma tributária na Câmara dos Deputados só votará o relatório do deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) em 2020. O colegiado foi criado em julho para discutir a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/19, do deputado Baleia Rossi (MDB-SP), construído a partir de orientações da equipe do economista Bernard Appy. Preocupada em introduzir aspectos progressistas no sistema do país, a oposição lançou em outubro uma emenda substitutiva global que chamou de “Reforma Tributária justa, solidária e sustentável”.

A comissão está na fase de promover debates, audiências públicas e seminários. Os partidos de oposição querem introduzir no arcaico, complexo e injusto sistema brasileiro conceitos progressivos, com a elevação da tributação sobre a renda e patrimônio, segundo o princípio constitucional de tributação conforme a capacidade econômica, de acordo com o qual “quem tem mais, paga mais”, a chamada progressividade tributária. No caso da provável aprovação da proposta de Baleia Rossi na comissão especial, a tática da oposição é apresentar o substitutivo e lançar mão de emendas baseadas em seu projeto no Plenário.

Membro da comissão, o deputado Enio Verri (PT-PR) afirma estar convencido de que é possível introduzir aspectos progressivos na reforma. Segundo ele, pontos como o fim da isenção de lucros e dividendos no imposto de renda de pessoa jurídica e IPVA sobre aviões, helicópteros, jet ski, lancha, iates e outros veículos devem ser aprovados na reforma, de acordo com suas conversas com o presidente do colegiado, Hildo Rocha (MDB-MA), o relator Aguinaldo Ribeiro e outros deputados.

“Hoje caminhamos para um consenso no sentido de aprovar vários pontos que são marca da injustiça tributária do país”, diz Verri. “Não quer dizer que tudo o que apresentarmos será aprovado, mas estou otimista. Acho que vamos conseguir construir um diálogo e muita coisa avançada será aprovada nessa reforma.”

O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), tem demonstrado abertura em relação à modernização  para um sistema mais justo. “Nós tributamos mais o consumo do que a renda, diferentemente dos Estados Unidos. Isso significa que tributamos mais a base da sociedade, proporcionalmente, do que os ricos. Quanto mais rico, menos impostos você paga”, disse nesta terça-feira (17), em Brasília.

Se Maia considera a reforma tributária essencial para o crescimento do país, como afirmou, a deputada Jandira Feghali (PCdoB) ironiza:  “mas não foi pauta prioritária neste ano. Deveria ter sido. O que ele, como presidente da Câmara, tem que fazer é acelerar a pauta, colocar como prioritária. É o que estamos tentando fazer”.

A PEC 45 de Baleia Rossi propõe unificar três tributos federais (IPI, PIS e Cofins), extinguir o ISS, todos sobre o consumo, e criar um Imposto sobre Operações com Bens e Serviços (IBS). Economistas, como Laura Carvalho, consideram positiva a simplificação do sistema. Mas isso é insuficiente, porque “não resolve o problema principal da tributação brasileira, que é a regressividade, o fato de que quem paga mais são os mais pobres, e não os mais ricos”, disse Laura ao Entre Vistas em agosto.

“Rodrigo Maia é um liberal. Mas, ao mesmo tempo, ele está vendo que o Brasil está entrando numa crise social gigantesca”, avalia Verri. “E vê que, se depender das políticas ultraliberais do Paulo Guedes e das besteiras do Bolsonaro, o Brasil não segura os próximos três anos”, diz. Há concordância entre algumas propostas da oposição e, pelo menos, algumas abordagens do presidente da Câmara.

“Nosso sistema tributário incide muito sobre consumo e muito pouco em renda e patrimônio. É preciso inverter isso e Rodrigo Maia concorda que é preciso uma transição, lenta e gradual, para que se tribute muito mais a renda e o patrimônio do que o consumo. Isso ele já disse publicamente e em reuniões comigo”, afirma o petista. “Infelizmente não será a reforma que eu gostaria, a que apresentamos, mas pode ter avanços.”

 

Diálogo

O papel do presidente da Câmara, no processo, é importante, observa Verri. Isso porque a Câmara tem um caráter “muito presidencialista” e a posição do presidente tem influência significativa. “Em especial do Rodrigo Maia. Ele representa o Centrão. Estamos falando de quase 300 votos.”

Em entrevista à RBA em setembro, o deputado Marcelo Freixo (RJ), representante do Psol na comissão especial, disse acreditar ser possível haver acordos “com algum nível de progressividade” nas discussões sobre o tema na Câmara. “A política é a arte de dialogar”, afirmou. Verri concorda. “No âmbito do Congresso, como disse o Freixo, o diálogo vai determinar avanço das propostas.”

“Achamos que dá para negociar parte da proposta”, diz Jandira Feghali. “Mas o tema não entrou na prioridade do parlamento ainda. Deveria ter sido a reforma prioritária, mas não foi. Quando entrar na pauta, vamos negociar o máximo que pudermos em torno dela.”

 

RBA, 19 de dezembro de 2019