Moro novamente em apuros: quando o pedido é uma ordem

21 de junho de 2019

Num flagrante de vassalagem dos procuradores da Operação Lava Jato diante do então juiz Sérgio Moro, trecho inédito revelado da conversa travada no Telegram entre procuradores da República — desta feita entre Deltan Dallagnol e Carlos Fernando dos Santos Lima — evidencia que os fatos contradizem a fala do ministro na audiência desta quarta na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. A informação é do Blog de Reinaldo Azevedo, no Portal UOL.

 

 

 

Ou por outra, diz ele: a sua ação interferiu de maneira evidente até na escalação de procuradores para participar de audiência da Lava Jato. A revelação da conversa faz parte de uma apuração conjunta do site “The Intercept Brasil” com o blog de Reinaldo Azevedo e com o programa “O É da Coisa”, da BandNews FM. 

Na primeira série de reportagens publicadas pelo site The Intercept Brasil, há uma troca de mensagens entre o então juiz Sergio Moro e Dallagnol. A conversa aconteceu no dia 13 de março de 2017. Interferindo de maneira escancarada no processo e na rotina da força-tarefa, Moro reclama com Dallagnol do desempenho da procuradora Laura Tessler. 

O assunto compareceu na audiência desta quarta. Às 6h20min13s (vídeo abaixo), o senador Nelsinho Trade (PSD-MS) pergunta se Moro, quando juiz, “participou da orientação de trocas de agentes protagonistas nessa operação”. Ele se referia justamente à procuradora Laura Tessler. E Moro dá a seguinte resposta a partir de 6h23min57s: 

Isso é o que diz Moro, alerta Reinaldo Azevedo. Em seguida, ele apresenta os fatos. 

Dezessete minutos depois de receber a mensagem do então juiz, Dallagnol passa a seguinte mensagem a seu colega Carlos Fernando: 

12:42:34 Deltan Recebeu a msg do moro sobre a audiência tb? 

13:09:44 Não. O que ele disse? 

13:11:42 Deltan Não comenta com ninguém e me assegura que teu telegram não tá aberto aí no computador e que outras pessoas não estão vendo por aí, que falo 

13:12:28 Deltan (Vc vai entender por que estou pedindo isso) 

13:13:31 Ele está só para mim. 13:14:06 Depois, apagamos o conteúdo.

13:16:35 Deltan Prezado, a colega Laura Tessler de vcs é excelente profissional, mas para inquirição em audiência, ela não vai muito bem. Desculpe dizer isso, mas com discrição, tente dar uns conselhos a ela, para o próprio bem dela. Um treinamento faria bem. Favor manter reservada essa mensagem. 

13:17:03 Vou apagar, ok? 

13:17:07 Deltan apaga sim. 

13:17:03 Vou apagar, ok? 

13:17:07 Deltan apaga sim 

13:17:26 Apagado. 

13:17:26 Deltan Vamos ver como está a escala e talvez sugerir que vão 2, e fazer uma reunião sobre estratégia de inquirição, sem mencionar ela.

13:18:11 Por isso tinha sugerido que Júlio ou Robinho fossem também. No do Lula não podemos deixar acontecer. 

13:18:32 Apaguei. 

Como se nota acima, Diz Reinaldo Azevedo, Dallagnol repassa a mensagem de Moro para Carlos Fernando. Mais do que isso: ele demonstra a disposição de mexer na escala dos procuradores para enviar para a audiência com Lula pessoas que estejam ao gosto do juiz. “Ora, Moro não sugeriu ou ordenou a troca explicitamente. Mas a interferência é evidente, e a sugestão estava dada”, enfatiza.

Dois meses depois, no dia 10 de maio de 2017, o ex-presidente Lula depunha, então, pela primeira vez em Curitiba. Do outro lado da mesa, Sérgio Moro — aquele que, na prática, coordenava a Lava Jato. Não! Laura Tessler não estava presente. Representaram o Ministério Público Federal justamente “Júlio” e “Robinho — respectivamente, Júlio Noronha e Roberson Pozzobon. 

Azevedo lembra que a fala de Sérgio Moro reúne um conjunto de absurdos. “Note-se que, ao mesmo tempo em que põe em dúvida a veracidade dos diálogos, diz não haver neles nada de mais. Há, sim! Fraudam o Código de Ética da Magistratura e o Inciso IV do Artigo 254 do Código de Processo Penal”, destaca.

Trata-se de um dos momentos em que o juiz interfere no andamento da Lava Jato e na rotina interna do próprio Ministério Público Federal, afirma. “E, como se nota, os procuradores atuam segundo o seu gosto.”

Laura Tessler não foi expulsa da Lava Jato. Mas não participou da audiência com Lula. Afinal, como escreveu Carlos Fernando, “no do Lula, não podemos deixar acontecer”, prossegue.

E arremata: “Notem os cuidados de Dallagnol e Carlos Fernando. Eles sabem que o trio está numa operação que frauda as regras do jogo, que contraria a lei. O interlocutor de Dallagnol fala duas vezes em apagar a mensagem. Parece que Carlos Fernando apagou, mas Dallagnol não.”

 

Vermelho, 21 de junho de 2019