O mundo do trabalho passa por constantes mudanças. Com elas, os desafios de compreender qual relação e o quanto de impacto há nas negociações coletivas entre patrões e empregados é medida que se impõe. Parte disso foi a reforma trabalhista, concebida pela Lei 13.467/2017, que gerou profundas “mexidas” na relação entre as partes mencionadas. Para tanto, algumas considerações devem ser feitas, sobretudo quanto à questão sobre se empresas e empregados devem negociar.
A negociação coletiva tem como principal característica garantir direitos aos empregados, de modo a equilibrá-los na relação de emprego com o patrão, normalmente em posição desigual e superior por comandar a estrutura econômica/financeira, administrativa etc. Ou seja, tudo, em razão de melhor atender às peculiaridades de cada setor profissional e econômico, respectivamente.
Tamanha importância é conhecida em todo o mundo, de tal forma que esse modelo é utilizado em vários países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), dentre eles Bélgica, França, Alemanha e Áustria, onde a cobertura é de mais de 90% da força de trabalho.
Nessa esteira, engana-se quem entende que esse equilíbrio gera ganhos apenas aos empregados. Pelo contrário, na medida em que a negociação for sacramentada, haverá segurança mútua, considerando, por exemplo, a aplicação para o que está escrito, bem como a limitação territorial para os novos direitos, evitando o surgimento de novas discussões ou processo de mobilização por outros sujeitos, capazes de causar prejuízos à empresa.
Tanto faz sentido que a Confederação Nacional da Indústria (uma das entidades que representam as empresas) apontou que “empresas e trabalhadores têm necessidades que variam de acordo com seu porte, com o setor que atuam e com a região onde se encontram. Pela negociação, as partes podem discutir problemas e demandas e chegar a um consenso dentro da capacidade da empresa e que seja reciprocamente benéfico”.
Seguindo, registrou que “a negociação coletiva é um instrumento essencial para que empresas e trabalhadores encontrem soluções de conflito por meio do diálogo, evitando a esfera judicial, que onera o contribuinte. Para se ter ideia, há 8,4 milhões de processos na Justiça do Trabalho (2014), o equivalente a uma ação para cada seis trabalhadores formais”.
Sob essa perspectiva, a nova CLT, em seu artigo 611-A, ressalvada algumas críticas — o que não se faz neste momento —, reforçou a possibilidade da negociação coletiva, inclusive dando superioridade ao que dispõe a lei.
Observamos que nos países da OCDE acima citados as negociações levaram à melhora na produtividade dos trabalhadores como contrapartida. Nesse sistema, o aumento da proteção não necessariamente refletiu em aumento dos custos de demissão para as empresas, pois a maior produtividade também gera menor necessidade de substituição dos empregados, reduzindo a rotatividade e, consequentemente, as despesas.
Vale lembrar que a Ford Brasil, como continuidade de parte de sua produção e de negócios, acordou em 2007 com o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC a manutenção da versão brasileira do Ford Ka, o que contribuiu com a manutenção de empregos, mas, sobretudo, com a lucratividade da empresa, que, inclusive, exportou o veículo para países da América Latina, como a Argentina.
De qualquer forma, outro ponto a ser ressaltado é que a negociação coletiva, através do acordo coletivo ou convenção coletiva, tem prazo de validade de, no máximo, dois anos (artigo 614, parágrafo 3º da CLT), razão pela qual permitirá que as partes rediscutam os termos ao final do prazo estipulado.
Portanto, em um momento de crise e desconfiança, as empresas buscam cortar despesas e eliminar postos de trabalho. Contudo, esquecem-se do instrumento de negociação coletiva como meio para sua retomada no mercado ou superação do momento em questão.
Embora haja resistência, seja pela falta de conhecimento ou por acreditar que a negociação é negativa, defendemos que, ao contrário, a mesma é importante para patrão e empregado manterem uma relação de ganha/ganha recíproco, inclusive para o primeiro, que é detentor do risco econômico.
André F. Watanabe é sócio do Crivelli Advogados Associados.