Trabalhadores têm segundo mês sem reajuste real

27 de setembro de 2018

‘Se a inflação não ceder, não há muito espaço para aumentos’, diz professor
Anaïs Fernandes

Agosto foi o segundo mês consecutivo em que o trabalhador não conseguiu reajuste salarial real, isto é, acima da inflação, em negociações coletivas.

O reajuste mediano no mês passado foi de 3,6%, exatamente igual ao INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) acumulado em 12 meses, apontam dados do Salariômetro da Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas).

“O último aumento real foi em junho. A partir daí, a inflação deu um salto e, como a crise continua, as empresas não conseguem absorver esse aumento nos custos e fica difícil para elas dar aumento real”, explica Hélio Zylberstajn, professor da FEA-USP e coordenador do Salariômetro.

Zylberstajn observa que as últimas projeções da pesquisa Focus do Banco Central mantêm a perspectiva de um INPC acumulado em 12 meses mais perto de 4% nos próximos meses. “Se a inflação não ceder, não há muito espaço para aumentos reais”, afirma.

Além do reajuste, que é a cláusula mais debatida no ano até agosto, representando 53,4% das negociações, e do piso salarial (48,9% das negociações), a pesquisa mostra o peso de articulações pela contribuição a sindicatos de trabalhadores: representaram 40,7% do total das negociações no ano.

“Isso é impacto da reforma trabalhista. A contribuição é mais negociada que adicional por hora extra, por exemplo”, diz o professor.

O imposto sindical tornou-se facultativo após mudanças na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) a partir de novembro do ano passado. Mas foi apenas em junho deste ano que o STF (Supremo Tribunal Federal) bateu o martelo e validou o fim do recolhimento obrigatório.

Segundo a Fipe, aos poucos, o fluxo de negociações salariais fechadas volta ao normal.

No ano até agosto, acordos e convenções somavam 15.074, 30% abaixo do nível de 2017. Essa diferença, no entanto, já chegou a superar 70%, no acumulado até maio, por exemplo.

“Parece que empresas e trabalhadores estão conseguindo resolver suas questões, principalmente em relação à contribuição sindical”, afirma Zylberstajn.

Das contribuições acertadas no ano, quase 29% são negociais –modalidade em que o valor é acertado no fechamento de acordos coletivos.

“Os números indicam que os sindicatos estão conseguindo concessões das empresas para colocar cláusulas que dão a eles essas contribuições”, observa Zylberstajn.

Reportagem da Folha em junho mostrou que a vice-presidência do TST (Tribunal Superior do Trabalho) vinha estimulando, em acordos coletivos, sindicatos e empresas a imporem o desconto de meio dia da jornada dos trabalhadores como uma alternativa para irrigar o caixa de entidades de representação de categorias.

A chamada cota negocial foi criada em acordo coletivo da Vale e do STEFEM (Sindicato dos Trabalhadores em Empresas Ferroviárias dos Estados do Maranhão, Pará e Tocantins).

 

Fonte: Folha de S.Paulo, 27 de setembro de 2018.